O abismo do nada

 Dentro das varias palavras e expressões da língua portuguesa, a que me gera mais incomodo é a palavra nada. O que é o nada? Bom, geralmente as pessoas usam para exemplificar o nada uma caixa vazia, porém, mesmo uma caixa vazia tem ar dentro dela, tem micróbios, pode até ter lá uma mosca pousada. Essa caixa também pode ser transformada, pode ser usada para guardar objetos, logo, uma caixa vazia não é o nada. Bom, o nada é quando tu vais dormir, e acordas na manhã seguinte como se nada tivesse acontecido, sem sonhos, sem nada! Só que na minha opinião, a melhor parte de dormir é justamente os sonhos, eles são a vida da tua mente! São parte de ti, manifestam as tuas duvidas, os teus desejos, o teu subconsciente! Uma noite sem sonhos é uma noite entediante.

Nas nossas vidas, o mesmo aplica-se. Geralmente associamos a morte ao contrario da vida, porém, eu discordo. A morte é uma etapa da vida, que inevitavelmente vai acontecer. E mesmo com a nossa morte, o corpo ainda tem bactérias que ajudam na decomposição e os nossos restos mortais poderão servir de adubo, gerando ainda mais vida. Logo, o contrário da vida não é a morte, mas sim, o nada. Uma pessoa só morre verdadeiramente quando é esquecida completamente. Camões por exemplo, nem se sabe se as ossadas que alegadamente são dele realmente lhe pertencem, nem se sabe ao certo o ano em que morreu, mas todos os portugueses sabem quem é Camões. Ele é ensinado nas escolas, os seus poemas são lidos até aos dias de hoje e ao longo da nossa historia inspiraram outros autores. Da para dizer que Camões transcendeu a necessidade de um corpo físico e continua vivo até aos dias de hoje. Com este exemplo dá para ver que a morte não significa o fim, esse só vindo quando somos totalmente esquecidos.

É isso que o nada é, a ausência de essência. A vida é sofrida, mas sofremos por que estamos vivos. Mesmo na morte nos sentimos alguma coisa, sentimos dor, arrependimento, vemos as nossas memorias pela ultima vez? O nada seria ter uma vida sem emoção, não por ser uma vida estável, mas sim por não existir nada. Algo que as vezes digo quando estou triste, é que isso significa que estou vivo. Uma pessoa que não esta viva não sente tristeza ou qualquer sentimento. Apatia neste caso, seria a verdadeira morte. Uma vida sem arrependimentos nesse caso, não seria realmente uma vida, pois, ao vivermos tomamos más decisões, cometemos erros, sentimos arrependimento. Há uma diferença clara entre ter uma vida onde aceitamos esse arrependimento e mesmo assim escolhemos prosseguir, e uma vida sem arrependimentos, pois, uma vida sem arrependimentos significa uma vida sem experiências. Ironicamente, isso poderá levar a um dos maiores arrependimentos de todos, o de não ter realmente vivido a vida. E com viver a vida eu refiro-me as varias formas de a apreciar, qualquer estilo de vida é melhor do que o nada. Seja um estilo de vida hedonista, um estilo de vida monástico, um estilo de vida tradicionalista, um estilo de vida artístico, qualquer coisa é superior ao nada, por que o nada é a ausência de vida. 

O nada não é necessariamente uma condenação, as vezes temos que aprender a dançar na chuva. Pois, o nada pode servir de energia para fazer alguma coisa. Um objeto parado pode mover-se se receber algum impulso, e esse impulso pode vir do próprio objeto ou de fatores externos. Mesmo uma pessoa depressiva, pode encontrar alegria nas pequenas coisas da vida, como jogar o seu jogo favorito, ir ao seu restaurante favorito almoçar ou ir ao cinema com algum amigo ou familiar próximo. O sofrimento é uma parte inevitável da vida, porém o pior tipo de sofrimento na minha visão, é o vazio! É estar trancado num quarto sem fazer nada e sem sentir nada, é quando reprimimos tanto o sofrimento interno que não sentimos mais nada não por que estamos felizes, mas por que não conseguimos exprimir nada!  Mais vale chorar do que não chorar, mais vale rir do que não rir, agora a apatia, isso sim é o problema. Por que a apatia e a indiferença nos consomem por dentro e por fora e nos esvaziam totalmente. O processo de transformar o sofrimento em algo, seja em lagrimas, seja em gritos, seja em arte, seja no que for, é o que nos faz humanos! É sinal que estamos vivos, sinal que nos preocupamos, sinal que temos razões para estar triste assim como razões para estar alegre.

 Uma vida vazia é aquela que torna na pessoa um zumbi, ou em termos "gaming", um npc. Ou seja, aquela pessoa que no fundo não tem tempo, ou usa o pouco tempo que tem para fazer absolutamente nada. Aquela pessoa que não tem hobbies, não gosta de nada, não desgosta de nada, a vida dela consiste em apenas ir trabalhar e voltar para casa. Uma vida assim é danosa, faz a pessoa perder o brilho, perder o gosto de viver e tornar-se apática, sem emoção, e é justamente isso que devemos evitar. Mesmo tendo um emprego, ou tendo que ir para a faculdade, a pessoa pode usar do seu tempo livre para fazer alguma coisa, como ir ao ginásio, estar com os amigos, ler um livro, fazer arte, qualquer coisa é melhor do que nada, nem que seja ir ao café tomar um galão e um bolo depois do trabalho. E mesmo que esse trabalho faça a pessoa ficar cansada, o cansaço da apatia é muito pior. Por que a apatia cansa, não ter emoções cansa, o completo vazio, cansa.

No fundo, o verdadeiro inferno é o nada. O que realmente assusta não é um local onde as chamas não param de queimar, mas sim, o vazio. Saber que depois da morte, não há nada, acabou! Pelo menos no inferno eu ainda teria a esperança de sair de lá, já no nada, eu simplesmente deixaria de existir. E a existência é algo que transcende a vida, se formos parar para analisar, a historia é justamente o estudo de pessoas que existiram mas não estão mais vivas. O nada seria justamente a anulação disso, se não houvesse nada após a morte não estudaríamos historia por que os feitos dos nossos antepassados simplesmente teriam caído no esquecimento, porém, eles estão presentes nos nossos dias mesmos após a morte deles. 

No fundo, o nada é algo que deve ser evitado nas nossas vidas. Pois, se não sentirmos nada, é por que não estamos realmente vivos.


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